Neste breve texto, me proponho a pensar algumas tendências modernas na fotografia brasileira a partir de uma questão técnica e de uma estética que busca na própria linguagem os problemas modernos da criação e da originalidade, enfim, nos deslocamentos visuais propostos pelas pesquisas fotográficas e nas diferenças que estabelece com a realidade. Esta busca se mistura com a criação do fotoclubismo e sobretudo com a formação do Foto Clube Bandeirantes que buscaram retirar o “tom” de documento da imagem fotográfica.
O Brasil sempre foi um país sensível à fotografia. Herculano Florence, um dos pioneiros da fotografia, residia no país; Dom Pedro II era um fotógrafo apaixonado e deixou um grande acervo de imagens fotográficas sobre o Brasil. A atenção perante a fotografia moderna começa no século XX, mais especificamente na década de 40, com a formação do Foto Clube Bandeirantes que trouxe uma nova preocupação estética a fotografia produzida no Brasil.
Dentro deste grupo podemos partir da obra de Thomaz Farkaz. Húngaro que chegou ao Brasil aos seis anos de idade e tem em seu acervo de imagens uma reflexão acerca do enquadramento e sobre pontos de vista inusitados, como mostra a imagem do cinema Ipiranga abaixo: seu objeto não é o cinema ou as pessoas que o frequentam, mas os desenhos que a arquitetura do lugar permite para repensar a visualidade que a imagem fotográfica pode apresentar.
Outro fotógrafo moderno brasileiro que se caracteriza pela pesquisa na imagem fotográfica foi José Yalent, um dos fundadores do clube. Uma sensível geometrização e uma ampla experimentação do contra luz faz com que suas imagens se destaquem pela inovação e criatividade. Em sua obra a sombra se torna objeto e elemento visual e é a partir dela que Yalent constrói muito de sua reflexão poética como percebemos na fotografia de arquitetura abaixo.
Geraldo de Barros reconstrói a realidade a partir de fotomontagens de objetos inusitados e temas variados. O fotógrafo explorou a linguagem fotográfica dentro de seu processo técnico, repensando a construção do objeto fotografia e do próprio processo fotográfico. Imagens que se sobrepõem e criam um ambiente diferente e que se destacam por sua plasticidade. Uma remontagem do real, um real reconstruído por um deslocamento na lógica do processo da fotografia.
É interessante pensar que os deslocamentos de Geraldo de Barros não acontecem apenas na fotomontagem; suas imagens fotográficas também elevam o pensamento e a reflexão estética no ato fotográfico. A imagem abaixo, uma das fotoformas, é a sombra projetada de uma maçaneta, uma imagem que não caminha nos campos comuns da fotografia como o retrato ou a paisagem, mas que desloca completamente o motivo e o objeto do fazer fotográfico.
Para encerrar gostaria de citar ainda a obra de José Oiticica Filho. O pai de Hélio Oiticica tem uma significativa produção fotográfica, mas que é pouco conhecida ou comentada. Sua relação com a fotografia se dava na tentativa de retirar dela todo o referencial documental e figurativo. Na imagem abaixo os objetos são explorados a partir de uma superfície transparente e com uma textura que deforma e reconstrói os objetos em uma abertura visual que comporta a mente criativa do artista de maneira semelhante à pintura.
Enfim, o que me propus foi levantar alguns fotógrafos e tendências na fotografia moderna brasileira que colocam o problema na lógica da linguagem para repensar a visualidade criada pela fotografia, longe de abordar toda a abertura moderna na fotografia brasileira, me baseei principalmente nos fotógrafos que apresentavam direcionamentos de pesquisa voltados a própria visualidade da imagem e que se tornaram referência a uma fotografia deslocada.
Fábio Salun
Mestre em Artes Visuais pela UDESC
fabio.salun@gmail.com
Referências:
ETCHEVERRY. Carolina Martins. As fotografias experimentais brasileiras nas décadas de 1950-60: Geraldo de Barros e José Oiticica Filho. IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação PUCRS, 2009. Disponível em: <http://www.pucrs.br/edipucrs/IVmostra/IV_MOSTRA_PDF/Historia/72005-CAROLINA_MARTINS_ETCHEVERRY.pdf>. Acesso em: 2018 jul.
HACKING, Juliet. Tudo sobre fotografia. Tradução de Fabiano Moraes, Fernanda Abreu e Ivo Korytosky. Rio de Janeiro: Sextante, 2012.
MIBELBECK, Reinhold. Fotografia no Século XX. Tradução de Sandra Oliveira. Lisboa: Atelier da Imagem, 1998.
SITE DO INSTITUTO MOREIRA SALES
SITE DO ITAU CULTURAL
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