O conjunto corpo/arte no trabalho de Katrina Neiburga

A videoarte letã e seu desenvolvimento começam com uma câmera nas mãos de artistas no século XX. O colapso do regime soviético e a promoção da arte inclusiva, usando essa mídia, criam fenômenos artísticos cada vez mais diversificados.

 

O trabalho de Katrina Neiburga é como uma viagem na história, porém que deixa abordar os principais pontos da mesma. A atmosfera de trabalho na Letônia é “poética” e “nórdica”. Ela explora as camadas culturais que formam o seu passado – pós-soviético, pró-ocidental, apolítico ou seu oposto – muito político. Ela revisita a história e reflete sobre o aqui e agora. Suas obras chegam próximas de um caráter  relatorial. Ele coloca em prática um mundo emocional interior, onde conta histórias coletivas e pessoais. Através de fotografias e filmes, ela documenta aspectos do passado e examina formas de expressão livre ou fenômenos culturais cujo lugar na história é perdido.

Armpit, por Katrina Neibruga

Katrina Neibruga usa uma visão antropológica, um fascínio lúdico pelos rituais da vida cotidiana, um interesse nas diferenças entre os papéis de gênero, um estudo do processo de memória. Em seu trabalho “Armpit”, ela se aproxima do microcosmo, ali representado pelas garagens. Durante a era comunista, os homens se viram lá sem qualquer distinção social, exceto pelos hobbies ditos oficiais supervisionados pelas autoridades comunistas, além de que trabalhar em garagens reduzia-se custos. Na era soviética, eles permitiram armazenar seus antigos objetos acumulados e transformavam essas garagens em grandes locais de diversidade de atividades. A garagem então, além de local de trabalho, também é local de hobby e atividades alheias à obrigações produtivas de trabalho. Isso permite que eles subvertam as ideias do neoliberalismo. Seu trabalho foi destaque na edição de 2016 do Coachella Music Festival, concebido como uma homenagem à era soviética de “garage mechanics”, ou a homens que se retiraram do mundo para inventar e cuidar de seu lazer.

 

Armpit, por Katrina Neibruga

Fluxus, por Katrina Neibruga

“Fluxus”, durante vinte anos, apesar das rupturas e exclusões, permanecerá fiel à sua utopia de partida: quebrar os limites da prática artística, romper as fronteiras entre as artes e construir um vínculo definitivo entre a arte e a vida. Este é o caminho que Katrina segue em seu trabalho sobre mulheres-taxistas, em que ela discute as condições sociais e econômicas que definem as mulheres. Ela percebe outra provocação feminista e socialmente investigativa: pegue um velho táxi, assuma o papel de taxista e, usando a imagem socialmente difícil de aceitar de uma jovem e atraente taxista, ela começa a conversa com os passageiros, que são gravados em vídeo. Sua prática nutrida pela profunda reflexão é relevante. Ela mostra uma energia renovada do estudo da imagem feminina.

Em seu último trabalho, “Kuku Marija”, a artista propõe uma análise cruzada de rituais de sociedades tradicionais, uma fonte de mutações que deixam de surpreender. Depois de um longo caminho, Katrina abre um buraco antes de se deitar lá e se cobrir. Pouco depois, ela renasce. Este trabalho traz dois aspectos da prática artística do Katrina: por um lado, a antropologia, herdeira de um debate vivo sobre a questão do ritual, e, por outro lado, a história da arte, uma disciplina diretamente relacionada com performances artísticas, mas também com as manifestações de tradições não-ocidentais envolvendo o corpo. O corpo é transformado durante a performance estabelecendo nesse desenho um tempo fora do tempo, durante o qual o corpo é submetido a um conjunto de transformações. Ela está imersa em um estado ritualístico.

 

Katrina Neiburga oferece insights sobre a dinâmica do tecido da individualidade nas sociedades ocidentais contemporâneas. As obras da artista letã são fontes de ações e emoções. Elas são altamente reflexivas do processo de autoconstrução e do papel essencial que os outros desempenham como testemunhas e como recursos.

Parceria: The Nomad Creative Projects

Tradução: Bárbara Gual

Revisão: Lívia Fernandes

@vhmor

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